Comorbidade: machismo
Assim que subimos o texto para o site e divulgamos nas redes, começaram a chegar comentários de leitoras e leitores contando que sabiam de casos semelhantes. E foram além. Um dos relatos no Instagram contava: “Tenho um monte de alunos que me falam que os pais não se vacinaram: o pai não deixou a mãe se vacinar e eles, os filhos, também não”. Outro acrescentou: “Eu conheço uma família que seguiu esse tipo de orientação. O marido proibiu a esposa, a cunhada e o sogro. Nessa, o marido também morreu. Ele, a esposa e o sogro. E uma segue com sequelas graves”.
Talvez você esteja pensando que essa é uma realidade distante da sua, envolvendo pessoas muito vulnerabilizadas e sem informação de qualidade, mas não é bem assim. Outro comentário dizia: “Minha tia e madrinha, médica, se foi numa situação assim. E eu ainda não superei a perda dela”. E houve ainda quem contasse que sabia de casos, na Itália e no Brasil, de filhos impedindo seus pais idosos de se vacinarem. Tão triste quanto assustador.
Decidi buscar essas histórias ainda no ano passado, porque tinha quase certeza de que esse tipo de coisa estaria acontecendo no país machista em que vivemos. Não só meu palpite se confirmou, como outros casos de abuso emocional e desinformação vieram à tona.
No Intercept, desde 2018 trago histórias em que o machismo maltrata o corpo e a saúde das mulheres, seja abordando as dificuldades em fazer uma laqueadura para não ter mais filhos, mesmo dentro da lei; seja denunciando estupros no sistema público de saúde; seja denunciando a violência obstétrica ou, mais recentemente, expondo o aparelhamento do Conselho Federal de Medicina no governo Bolsonaro — que tornou a autarquia um reduto de misoginia e de ameaça aos direitos das mulheres.
O relato de Nathália à Yasmin, engrossado tristemente pelo testemunho dos nossos leitores nas redes, mostra que o controle sobre os corpos e a saúde das mulheres é um assunto tão grave quanto urgente, que só se agravou no governo Bolsonaro, e que até mesmo em um cenário trágico como o da pandemia insiste em fazer das mulheres alvos e vítimas.
Bruna de Lara – Editora do The Intercept Brasil