As cavernas do mito

 

Platão foi um escritor fantástico, o mais importante dos três que escreveram sobre Sócrates. Escreveu livros didáticos, traziam informação e um método de análise, ou seja, ensinava a pensar. Era um homem além de seu tempo. Um geneticista certamente identificar-se-á com a tese dos filhos de ouro, prata, bronze e ferro (A República, cap. III).

Uma de suas lições mais importantes é o mito da caverna, sobre os prisioneiros que só veem as sombras. Quando um escapa e vê a luz, as cores e as formas, uma metáfora para o conhecimento e sabedoria, vivencia uma experiência indescritível.

Platão torna límpido como o mar de Maresias, em São Sebastião (São Paulo), o conhecimento e o entendimento andam de mãos dadas e entender os tempos atuais e os acontecimentos exige qualidade da informação e bons analistas (professores). Porém, para manter seu poder, lideranças da extrema direita e da extrema esquerda impõem a seus seguidores as mesmas táticas dos líderes fanáticos de seitas religiosas: ignorar fontes externas de conhecimento (jornalismo de boa qualidade, feita em grandes ou pequenas redações) e apenas ler o que produzem seus gurus. Poder, nesses casos, representa dinheiro para os bolsos deles.

Por isso, matérias que fazem pensar são lidas por aqueles que buscam pensar, aprender e ter novidades, e quando são oferecidas aos fanáticos, não são aceitas, também pela incapacidade de entender, já que desaprenderam a aprender.

É o que aconteceu recentemente, o presidente Jair Bolsonaro publicou em 12 de janeiro último um decreto que autoriza a destruição de qualquer tipo de caverna para a construção de empreendimentos considerados de utilidade pública. Para este presidente não afeito ao estudo (dá muito trabalho), as cavernas são “buracos de tatu” e atrapalham o desenvolvimento do Brasil. Cita como exemplo uma fábrica da Heineken em Minas Gerais, que foi embargada pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) por risco de danos ao sítio arqueológico onde foi localizado o crânio de Luzia, o mais antigo fóssil humano encontrado nas Américas.

É uma visão tão nanocefálica (de céfalos, cabeça e não fálos), quanto inacreditável. Como se o Brasil e Minas Gerais, particularmente, tivessem problemas de espaço. Vivo no estado de São Paulo, que é pequeno e ocupado e, mesmo assim, vejo muito espaço vago onde se poderia instalar fábricas e mais fábricas. Ou seja? Podemos conciliar empreendimento e conservação das riquezas naturais.

Esses fanáticos conseguirão entender isso? Oras, não entendem que a maior riqueza de uma nação, de um povo, de uma família, de um ser humano é a água potável! Ou só água, haja vista o que fazem israelitas e árabes, transformando as águas marinhas em potável. Mas na pátria brasilis, em nome do desenvolvimento (desenvolvimentismo do século XVIII), destroem os rios aéreos da Amazônia (árvores gigantes com mais de 300 anos), as áreas de proteção ambiental que protegem as nascentes (secando a região), uso das águas subterrâneas do semiárido nordestino (tornando as terras salobras) e muitas outras idiotices que encheriam uma biblioteca.

Mario Eugenio Saturno (cientecfan.blogspot. com) é Tecnologista Sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano