O dilema da renovação na política – Alex Canziani
Para mudar as estruturas que regem o esporte no Brasil um grupo de atletas de ponta se mobilizou e conseguiu aprovar o limite de mandato de dirigentes das federações em quatro anos – com direito a somente uma reeleição. Impedir que dirigentes se perpetuem no poder foi o primeiro passo para tornar as entidades esportivas mais transparentes, éticas e eficientes. Na política, movimento semelhante é preconizado por vários setores da sociedade. Para um parlamentar com vários mandatos, o clamor pela renovação na política impõe um sério dilema.
A atividade política exige grande renúncia de vida pessoal e, portanto, pressupõe uma fé muito grande na capacidade de a democracia melhorar a vida das pessoas. Ou a própria, claro. Mas se a motivação do agente público é a coletividade, como esperamos, ele precisa, acima de tudo, confiar na sabedoria do senso comum, que hoje prefere candidatos antipolíticos. Um desafio para alguns que construíram longa trajetória atuando como representante dos interesses de sua comunidade, seja como parlamentar, seja como governante.
Dizem que política não deveria ser profissão. Seria sacerdócio? Não importa. De um modo ou de outro, a atividade exige um alto preparo e experiência prática. Assim como não embarcaríamos num avião construído por curiosos, ou entregaríamos nosso corpo a um cirurgião malformado, não deveríamos colocar na direção dos interesses da coletividade um amador.
Para quem está de fora, a atividade política pode parecer trivial. Não é. A representação pressupõe diferentes especializações: sensibilidade para ouvir; talento para negociar; discernimento para projetar cenários e coragem para tomar decisões.
No plano pessoal ou profissional, claro, estamos sempre administrando conflitos. O empresário e os gestores lideram processos. Mas nesses casos, estamos sempre falando de diferenças que englobam um espectro restrito da sociedade. A peculiaridade da gestão nas instituições públicas é que ali a diversidade é global. Na democracia, diferente dos nossos negócios particulares, é preciso sempre admitir o pluralismo de opiniões e interesses. E com esse pressuposto, só há uma maneira de se resolver as diferenças – negociando.
A inexperiência política da última presidente levou à desagregação da sua base no Congresso e resultou numa grave crise. Mas parece que essa foi a única lição que não se extraiu do trauma recente e que ainda nos assombra.
O Presidencialismo está fragilizado e as instituições políticas estão em xeque. Construir um novo arranjo sobre os escombros de uma ordem superada é como trocar os pneus com o carro em movimento. Mas o pior não é isso. É tentar fazer o novo sem assimilar as lições da experiência anterior, não acumular o conhecimento de tudo o que se fez – de certo e de errado.
Na redemocratização, como acontece agora, setores da oposição emergente se apresentavam como detentores do monopólio das virtudes. Aquele radicalismo excludente semeou intolerâncias que se mostrou implacável quando os mesmos chegaram ao poder.
Descartar as experiências do passado e condenar todos os atores políticos do presente é o passaporte para se repetir os erros, e não o contrário. Chamar todo político de ficha suja é o melhor álibi para livrar os desonestos. Governar é a prática da aproximação e não da desagregação.
Assim como no esporte de alto rendimento, a arena política envolve competição no limite. O exercício do poder exige acomodar uma complexidade de interesses extraordinária, que aumenta à medida que se amplia o escopo de sua atuação. Tomar decisões demanda uma enorme capacidade de liderança para conciliar e agregar. Do mesmo modo, para fazer boas escolhas, o eleitor precisa agir com sabedoria e moderação.