Médico alerta para “morte social” de idosos isolados pela pandemia

Principal grupo de risco da pandemia de covid-19 a população idosa está há três meses em isolamento. Se cumpriram a orientação de não sair de casa e não receber visitas, os idosos conseguiram se proteger do coronavírus, mas podem ter descompensado o controle de outras doenças como diabetes, hipertensão, osteoporose e, principalmente, problemas psicológicos como depressão ou ansiedade.

O geriatra Carlos Sperandio, que tem visitado asilos de Curitiba para atendimento domiciliar aos moradores destas instituições constata o agravamento do quadro de saúde desta população isolada.

“A gente tem vivido, no Brasil, uma morte social do idoso. Ele já é um grupo populacional marginalizado. Agora, eles estão em uma prisão domiciliar decretada pelo senso comum. Isso está sendo extremamente doloroso e vai cobrar o seu preço”, lamenta o profissional. “Já é constatado o aumento nos casos de suicídio, de depressão e ansiedade; casos de piora clínicas de pacientes que precisavam respirar o ar de fora de casa, para manter sua inteligência, sua cognição seu emocional, ou de doenças orgânicas que exigem que a pessoa se movimente; ou casos mais graves em que a pessoa precisa frequentar o hospital e está deixando de fazer por medo do covid”, diz. “O covid veio para escancarar como essa morte social é dolorosa”.

Para o geriatra, com o aumento do conhecimento sobre as formas de transmissão do coronavírus permite se pensar numa forma de promover uma “saída segura” para o idoso ou, até, que ele receba visita. “Se a gente conseguir passar para esses idosos e seus familiares como funciona a transmissão do vírus, a gente consegue apontar uma lacuna para uma saída de casa ou uma visita bem feita. Até porque seria hipocrisia achar que as pessoas não tenham, vez ou outra, quebrado a quarentena. Estão fazendo sim e, às vezes, de modo muito inseguro”, diz.

Ele afirma ser saudável que o idoso consiga sair de casa para se exercitar e tomar sol, evitando o sedentarismo e o agravamento de doenças crônicas. “Para isso, ele deve utilizar uma das máscaras que protejam ele e não os outros. Então, idosos não devem usar máscaras de pano, mas sim as máscaras N95, que filtram até 95% dos microorganismos. Daí, pode fazer uma caminhada ao sol, sem entrar em ambientes fechado, mantendo distância de dois metros das outras pessoas, carregando álcool em gel para fazer higiene das mãos se encostar em algo e quando voltar para casa”, diz.

O médico também diz que é possível o idoso receber visita de forma segura. “Você pode visitar seu pai ou seu avô, desde que você seja uma pessoa que esteja se protegendo muito, que não esteja indo à balada, frequentando aglomerações, se expondo a contato com pessoas que você não sabe se está se cuidando. Se você está se cuidando e você vai visitar seu pais, mantendo a distância de 2 metros, deixando o sapato fora da casa deles, higienizando as mãos, utilizando a máscara mesmo dentro de casa. É uma visita segura”, explica.

“Não podemos ir contra a orientação da autoridade sanitária, mas temos que ter bom senso que esses idosos estão pagando um preço muito grande por esse isolamento obrigatório. Então, com segurança, dá para fazer algo para melhorar”.

Por conta desta marginalização do idoso, o médico condena a proposta de isolamento vertical, que consiste em isolar apenas as pessoas do grupo de risco, mantendo as atividades normais dos demais. “Não há dúvida que se fizermos esse tipo de isolamento estaremos sendo cruéis e decretando oficialmente a morte social dos idosos, que já vinham compadecendo”, diz Sperandio.

“Por isso que o melhor é o caminho do meio. Manter os idosos e demais grupos de risco fechados, primeiro não impede o contágio de todos, pois muitos ou vivem com alguém ou precisam de pessoas que vão e vêm. Segundo, muitos precisam da vida em sociedade para se manter vivos, cuidando de sua estabilidade emocional e das doenças crônicas não transmissíveis”.

Isolamento respiratório e não social

Carlos Sperandio evita criticar a política de isolamento adotada pelo Paraná no início da pandemia, mas defende que, ao se conhecer melhor o vírus deve-se praticar o isolamento respiratório e não social. “A partir do momento que a gente entende que a transmissão do vírus ocorre de árvore respiratória para árvore respiratória, a gente começa a entender como é o mecanismo de contágio. A secreção de via aérea. Se você conseguir escapar de secreção de via aérea, você está ‘safo’. Então, higienizando sistematicamente as mãos, usando máscaras o tempo todo e mantendo-se a dois metros de distância de outras pessoas, estamos protegidos”, diz.

O geriatra reconhece que as medidas de isolamento adotadas em março contribuíram para o Paraná controlar a curva de contágio do vírus nos primeiros meses, mas criou-se o risco de um crescimento de casos justamente no inverno, período natural de maior ocorrência de síndromes respiratórias.

“O Paraná conseguiu uma situação privilegiada com o isolamento precoce e por ser o primeiro estado a adotar o uso de máscaras. Mas era muito difícil a gente manter as pessoas em isolamento por três meses. E, agora, as pessoas não estão mais fazendo distanciamento e, sequer, usando a máscara. Estamos correndo um risco enorme, pois abrimos mão das duas principais medidas de proteção”, diz.

Ele nega, no entanto que a reabertura do comércio seja o principal fator do aumento de casos. “O problema de Curitiba não é a reabertura de shoppings e academias, por exemplo. Lá há regras e estão sendo cumpridas. Medição de temperatura, máscara, distanciamento. O problema está onde não se cumpre as regras. Aqueles vídeos de baladas com shows e as pessoas curtindo, próximas, sem máscara, é assustador. Mas a principal regra é o bom senso de cada um. Uma pessoa com sintoma não pode sair de casa – só depende do bom senso dele, é educação sanitária”, conclui.